Seis em cada dez farmácias e supermercados desrespeitam a legislação que regula o marketing de produtos que podem competir com a amamentação, como leites, fórmulas infantis, chupetas e mamadeiras. A conclusão é de um estudo feito em sete cidades brasileiras pelo Observatório de Saúde na Infância (Observa Infância), que reúne pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Centro Universitário Arthur de Sá Earp Neto (Unifase).

A promoção comercial de fórmulas infantis, mamadeiras e chupetas é proibida em supermercados e farmácias, o que significa, por exemplo, que os estabelecimentos não podem realizar ofertas e descontos, exposição especial em pontas de gôndola ou em displays destacados e distribuição de brindes ou amostras grátis desses produtos. 

Descumprimento

Segundo a pesquisa, realizada no Rio de Janeiro, em São Paulo, Florianópolis, João Pessoa, Brasília, Ouro Preto e Belém, os principais produtos que descumprem a legislação vigente são compostos lácteos (45%), leites (35,4%), papinhas e mingaus para bebês (28,9%), fórmulas infantis (15%), bicos como chupetas ou mamadeiras (9,8%) e fórmulas especiais (3,7%).

Segundo a Fiocruz, Belém registrou o maior índice de infrações em farmácias e supermercados à legislação vigente (71,6%), seguida de São Paulo (69,9%), Rio de Janeiro (65,7%), Brasília (64,1%), João Pessoa (60,3%), Florianópolis (47,1%) e Ouro Preto (28,7%). 

Coordenador do Observa Infância, o pesquisador em saúde pública Cristiano Boccolini explica que o objetivo do estudo é gerar evidências científicas para apoiar políticas públicas mais eficazes para a proteção e a promoção do aleitamento materno. 

O pesquisador foi consultor convidado pela Organização Mundial da Saúde em um estudo divulgado em abril que avaliou o impacto global do marketing digital na promoção e na venda de produtos que competem com o aleitamento materno. 

O levantamento global apontou, entre outros problemas, que posts de companhias que fabricam produtos que competem com a amamentação têm um alcance três vezes maior que o de posts relacionados aos benefícios do aleitamento materno.

“O relatório também mostra que mulheres que publicam em suas redes sociais conteúdo relacionado a suas experiências com a amamentação são assediadas com a publicidade de produtos como mamadeiras e fórmulas infantis”, acrescenta Bocolini, que concedeu entrevista à Rádio Nacional do Rio de Janeiro e defendeu maior fiscalização de estabelecimentos e conscientização de profissionais de saúde sobre o tema.

“Esse exemplo da promoção comercial nas farmácias e supermercados é uma pontinha do iceberg. A gente tem a indústria convencendo e patrocinando profissionais de saúde a utilizarem seus produtos, e a gente tem o marketing digital que está cada vez mais disseminado e amplo”.

Procurada pela Agência Brasil, a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) disse que não irá se pronunciar sobre a pesquisa. Já a Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) afirmou que não se manifesta sobre práticas de cunho comercial das empresas e que desconhece qualquer notificação enviada às redes de farmácias associadas dando conta desse descumprimento.

Frases de advertência

A regulação do marketing de fórmulas infantis, bicos, chupetas, mamadeiras e outros produtos que competem com o aleitamento materno é prevista pelo Código Internacional de Comercialização de Substitutos do Leite Materno, da Organização Mundial da Saúde (OMS), adotado como norma no Brasil, pelo Ministério da Saúde, em 1988. No país, a Lei 11.265 de 2006 também trata do tema, regulamentado no Decreto 9.579 de 2018.  

Além de algumas proibições, há ainda produtos que precisam ser comercializados com frases de advertência, como “O Ministério da Saúde informa: o aleitamento materno evita infecções e alergias e é recomendado até os 2 anos ou mais”, no caso dos leites e compostos lácteos, e “O Ministério da Saúde informa: após os 6 meses de idade, continue amamentando seu filho e ofereça novos alimentos”, no caso de alimentos de transição, como papinhas, sopinhas e cereais infantis. Nesses casos, as frases de advertência devem ser legíveis, em negrito, emolduradas e próximas ao produto comercializado em promoção. 

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