A cena teatral nordestina conquistou lugar de destaque com o público carioca, que tem garantido a continuidade das produções no Rio. Uma das atrações é a do ator e produtor piauiense Vitorino Rodrigues, integrante do grupo Truá Cia de Espetáculos do Piauí, em temporada na cidade até o próximo domingo (28).
Vitorino Rodrigues, que investiga as novas escritas teatrais no Nordeste, apresenta o monólogo O Que Te Escrevo É Puro Corpo Inteiro, no Teatro Dulcina, no centro da capital, com texto de Nathan Sousa e direção de Wellington Júnior. O texto trata do conflito de um professor de literatura, escritor e ator que, ao passar a limpo sua história de vida, faz uma reflexão sobre a relação com alunos, leitores, público e todas as questões que se relacionam a este percurso socioafetivo.
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Este é um dos exemplos da chegada das produções teatrais nordestinas ao Rio, que têm como característica a diversidade de temas. De acordo com os produtores, acabou a ideia de que, para falar de Nordeste, tinha que abordar somente a seca e a miséria do povo. Para o ator, esse aspecto resultou em maior visibilidade das produções e fortaleceu o interesse do público na cena teatral nordestina.
Vitorino Rodrigues acrescentou que a visibilidade tem se ampliado também com a televisão, que tem incluído mais atores nordestinos em novelas e seriados e feito produções com o elenco formado, na maioria, por artistas da região. “Há vários nordestes e possibilidades de se exercitar as artes cênicas que estão aí”, disse, em entrevista à Agência Brasil.
Para a atriz Quitéria Kelly, fundadora do Grupo Carmin, de Natal, embora o tema regional ainda seja abordado, as fronteiras vêm sendo quebradas, e as produções passaram a ter temas mais diversos.“Existe uma complexidade cultural quando se fala de Nordeste, porque Nordeste parece que só é a coisa regionalista, mas o Nordeste é múltiplo. Nosso grupo nunca fez peça regionalista, e não deixa de ser um grupo nordestino”, disse Quitéria à reportagem. Segundo a atriz, não se pode esquecer que cada estado que compõe a região tem uma cultura específica.
“Quando se fala sobre um grupo nordestino, fala-se do Nordeste a partir de onde? Do Maranhão? É uma cultura completamente diferente da de Pernambuco, que é completamente diferente da da Bahia. Então, é muito difícil definir o que é o teatro nordestino, porque já não se enquadra mais nessas amarras do regionalismo. A gente está falando de tudo. Os temas são diversos”, afirmou.
A produtora Mariana Areia Leão Hardi faz coro com a questão da regionalização. Para Mariana, as produções estão se destacando com vários temas. “Encaixotar tudo em seca é resumir bastante um espectro enorme como é a Região Nordeste”, disse à Agência Brasil.
Mariana destacou que o aumento de produções nordestinas no Sudeste não se restringe ao teatro, ocorrendo também na área cinematográfica, em um processo de autoconhecimento da classe, que busca se impor em outras regiões sem ser de maneira negativa. “Cada vez que uma obra dessas ocorre fora do seu eixo, ela inevitavelmente provoca reflexão e discussão, tornando o público mais disponível para visualizar e entender.”
“É um trabalho continuado, um processo de reconhecimento de que nosso trabalho é digno, bem-feito, pode chegar a qualquer lugar e que o nosso produto dialoga com o público”, completou Mariana, que está envolvida ainda com a proposta de um laboratório da produtora Casa da Praia Filmes, previsto para o período de 26 a 30 de junho, com 15 projetos de todo o Nordeste, que serão escolhidos por meio de um edital. Os autores passarão uma semana em Natal trabalhando nos projetos de longas-metragens. O nome dos escolhidos será divulgado na próxima sexta-feira (26).
Editais
Na visão do ator e produtor Vitorino Rodrigues, os editais de apoio à cultura contribuíram para o aumento das produções na cidade. “Com isso os grupos têm conseguido de alguma forma se financiar para circular, porque não é fácil circular”, disse.
Quitéria lembrou que, de uns dez anos para cá, tem sido cada vez mais constantes as apresentações de grupos de artistas do Nordeste no Rio e ressaltou que isso também é reflexo dos editais. Segundo a atriz, o panorama dos editais começou a mudar na época em que Gilberto Gil foi ministro da Cultura, no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Naquele momento, o governo tomou a decisão de pulverizar os editais por todas as regiões do país, o que evitou a concentração de contemplados no eixo Rio-São Paulo, como costumava ocorrer.
Ela disse que o Grupo Carmin está participando agora do Palco Giratório do Sesc, projeto de difusão e intercâmbio das artes cênicas, que leva as produções de circo, dança e teatro para diversas cidades do país. Na 17ª edição, que está ocorrendo em Porto Alegre, o Carmin está na programação com a peça A Invenção do Nordeste, premiada no Rio no ano passado e bem recebida pelo público. “Ele [Palco Giratório] é um dos grandes promovedores da circulação de espetáculos tanto do Nordeste quanto do Norte no país inteiro. Os espetáculos giram o mapa inteiro, permitindo que o público do Sudeste conheça as produções do Norte, Nordeste e do Sul.”
A atriz lamentou a redução do número de festivais que ajudam no surgimento de novos grupos. Para Quitéria, os festivais ainda são uma porta aberta para os produtores independentes investirem em grupos e outros públicos terem acesso à produção que está sendo feita no Nordeste.
“A produção é muito atuante no Nordeste e tem grupos de longa data. Tem grupo no Rio Grande do Norte que tem 45 anos de história. Tem muita coisa. Tem o Grupo Macaxeira, no Ceará, o Ser Tão, da Paraíba, e o Carmin, do Rio Grande do Norte. Tem agora o pessoal da Casa de Zoé, que tem chegado pelo Sudeste com muita força e também é do Rio Grande do Norte. Então, tem um movimento legal que tenta chegar até aqui e tem conseguido a duras penas, mas tem conseguido”, concluiu a atriz
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